quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

O I Ching e as Previsões

 
A alguns dias coloquei um texto no blog que falava de previsões do I Ching para os jogos do Santos no Mundial Interclubes, realizado no Japão em dezembro. Elas foram feitas por um japonês idoso, profissional de previsões com I Ching em Yokohama. No primeiro jogo,  contra o Kashima Reysol, o consultor japonês deu como certa a vitória do Santos (o que de fato aconteceu sem qualquer problema para o time brasileiro). Quando foi verificar os augúrios para o jogo contra o Barcelona, o consultor ficou atrapalhado e teve que verificar suas anotações e consultar o livro. No final, deu parecer favorável ao Santos (o jogo, depois, se revelou um desastre para eles!).

Não quero justificar o erro, mas explicar o mecanismo da coisa. Este texto que escrevo foi motivado por um internauta que colocou o seguinte comentário no post, depois do jogo:

“Eu acho interessante essa arrogância de querer "adivinhar" algo que ainda não aconteceu. Isso sempre foi mentira e, como era de se esperar, fez-se mais uma vez.”

Com certeza o rapaz foi muito duro com o idoso consultor japonês, mas sua opinião é muito comum. Vê-se que deu grande importância à previsão errada e se esqueceu que ele acertou a primeira. Normalmente o cético age exatamente desta maneira: quando a previsão se mostra correta é “coincidência” e quando se mostra equivocada, é prova da “fraude”.

Mas o ser humano sempre desejou saber o que está por vir desde sua ascensão da condição de primata, e esse desejo se manifesta fortemente mesmo nos dias de hoje. Muitos ramos do conhecimento humano, incluindo a ciência, se preocupam em fazer previsões. E ninguém recrimina a ciência por isso.

A Economia faz previsões constantemente, tentando “adivinhar” o que acontecerá com os mercados financeiros. Depois de anos acompanhando essas previsões, prefiro confiar em um astrólogo. Ademais, todo economista faz previsões financeiras, mas a maioria não é rica, o que deveria ser o caso se acertassem com freqüência.

Outro bom exemplo é a meteorologia. Ontem fui até Aparecida, visitar o Santuário de Nossa Senhora. A previsão do tempo dizia “nublado com chuvas, temperatura máxima de 26ºC”. Me preparei, fui com capa e guarda-chuva e roupas mais pesadas. Na realidade fez 30ºC com sol de verão a pino e sem uma gota de chuva. Imagine se depois dessa previsão desastrosa eu dissesse: “Cara, isso sempre foi mentira e nunca mais vou ver a previsão do tempo de novo pois são todos charlatões”. Eu não estaria sendo justo, pois os métodos meteorológicos de previsão evoluem constantemente e mais tecnologia é desenvolvida para aperfeiçoar isso. No entanto eu me prendi a uma previsão que deu errado e não nas tantas que deram certo. E a meteorologia continua errando e as pessoas continuam seguindo suas recomendações. E ainda existem aqueles que criticam os que buscam orientação na astrologia, por exemplo!

A astrologia é muito, muito antiga. Parece ter começado na Babilônia 4.000 anos antes de Cristo. O certo é que os antigos eram muito eficientes em observações e cálculos astronômicos, como mostram as observações de cometas feitas pelos chineses da antiguidade, ainda hoje utilizados como referência por modernos astrônomos. Grandes monumentos megalíticos foram erigidos com espantosa precisão astronômica, uma precisão que assombra os especialistas de hoje.

Mas a astrologia é vista por “cientistas” e gente cética em geral como uma bobagem supersticiosa, talvez por não saberem exatamente do que se trata e acreditarem que são baseadas em “previsões do futuro” (que, como vimos, também são feitas pela ciência). As fases da lua possuem profunda e clara influência sobre a vida na Terra, demonstrada facilmente pela própria ciência. O comportamento animal, vegetal e humano é profundamente influenciado pela posição da lua em relação à Terra. Seria tolice não acreditar que alinhamentos astronômicos de planetas no sistema solar não pudesse desencadear alterações gravitacionais que tivessem também sua influência sobre nós. Estamos falando de física e não de alguma energia mística. Talvez os antigos tivessem meios de calcular como essas influências acontecem, da mesma forma como os psiquiatras sabem que a lua cheia provoca crises em pacientes com problemas mentais, mesmo que eles estejam em confinamento e nem saibam em que dia do mês estão. Ou os mateiros que sabem que as ervas medicinais devem ser colhidas na lua cheia, quando seus talos estão plenos de seiva, ou os lenhadores que sabem que a madeira cortada na lua nova é mais “seca” e aproveitável..

Com o I CHING é a mesma coisa. Sua complexidade dá nó em muita gente experiente. Um especialista me disse uma vez que quando a previsão falha é porque houve um erro do intérprete. Concordo, em parte, e isso deveria ser claro para todos. Quando a meteorologia erra uma previsão, isso pode se dar por erro na interpretação das mudanças atmosféricas. Ano passado o INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) recebeu um novo supercomputador Cray, apelidado de “Tupã”, para gerar mapas meteorológicos com base nos dados recebidos de diversas estações. Esses mapas são interpretados por meteorologistas de carne e osso, que podem acertar ou não sua análise.

Pode acontecer também que a direção de uma corrente de ar ou o calor de uma corrente marítima não se comportem como esperado, devido a inúmeros fatores. O Universo está em constante movimento, em constante mutação – a raiz da sabedoria do I Ching. Isso nos leva a compreender que qualquer alteração na realidade que examinamos acarretará alterações em seu futuro e imprecisões na previsão. Da mesma forma, quando se faz uma previsão para o mundo humano, enxerga-se o cenário com maior probabilidade de acontecer. Mas qualquer alteração na condução da situação ou de seus integrantes pode alterar esse “futuro”. O I Ching e qualquer outro método oracular sempre apontará para situações com maior probabilidade de acontecer se os eventos atuais persistirem em seu curso. As previsões nunca são sobre o que efetivamente acontecerá, mas sobre o que poderá acontecer se nada for alterado. A regra é a mesma da meteorologia, da economia, da sociologia e qualquer ciência que tente antever os acontecimentos futuros. No caso citado sobre futebol, no jogo contra o Al-Sadd, do Qatar, o atacante do Barcelona, David Villa, sofreu uma fratura na perna esquerda e ficou de fora do jogo contra o Santos. Como isso alterou o quadro do jogo, nunca saberemos. Mas algo importante aconteceu entre a previsão e o fato. Lembre-se, o Universo está em constante mutação.

As previsões do I Ching podem ser equivocadas, certamente. Mas não vamos queimar ninguém na fogueira por isso, assim como não queimamos nossos meteorologistas.


* grafei “cientistas” com aspas porque cientistas de verdade possuem mente aberta e não se apegam a convicções pessoais ou conceitos e ideias pétreas e predefinidas.


Nenhum comentário:

Postar um comentário